Por Eduardo Schumacher*

AS NECESSÁRIAS MUDANÇAS DA LEI DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

 

Não há dúvidas que a Lei 11.101/2005 trouxe grandes avanços no que diz respeito a mecanismos mais eficientes e eficazes para a equalização de passivos de empresas em dificuldades financeiras, ainda mais se comparada à antiga Concordata Preventiva (Decreto-Lei 7661/1945).

Passados 12 (doze) anos da vigência da nova lei, começa a tramitar no Congresso Nacional projeto de lei para modificar a legislação falimentar e de recuperação judicial.

Vários pontos poderiam ser melhor tratados em uma atualização da lei em vigência, porém, as modificações que são trabalhadas atualmente servem apenas para atender aos interesses das instituições financeiras, não havendo qualquer previsão para solucionar problemas pontuais que poderiam ajudar as empresas na recuperação de seus problemas financeiros.

Um dos pontos que o mercado financeiro – sobretudo os bancos – busca manter fora do alcance das recuperações judicias são os créditos com garantia fiduciária, podendo os bancos negociar seus créditos diretamente com as empresas em dificuldade. Como argumento para manter estes créditos fora da recuperação judicial os bancos alegam que caso haja alteração neste sentido o juro dos empréstimos para as companhias sofreria um aumento, além do que a liquidez para as empresas de médio e pequeno porte pode diminuir.

Pura retórica!

Mais uma vez estamos frente ao poder econômico influenciando e, por que não dizer, legislando contra o mercado e a cadeia produtiva. Não restam dúvidas que seria muito salutar para as empresas em recuperação judicial que os créditos com alienação fiduciária pudessem ser tratados dentro de um acerto global, junto com os credores das demais classes, cujas negociações seriam tratadas com transparência e não de forma unilateral e no apagar das luzes como ocorre atualmente.

Há uma corrente de doutrinadores que, acertadamente, advoga pela inclusão dos créditos com alienação fiduciária na recuperação judicial como uma classe única para estes credores. Neste caso, os credores com garantia real não teriam que partilhar suas garantias com toda a massa e teriam o valor integral da referida garantia em caso de liquidação dentro da recuperação.

O segundo ponto que está passando por fora do projeto da nova lei de recuperação judicial diz respeito aos garantidores.

É que atualmente encontra-se em vigência norma estabelecendo que muito embora estando o devedor principal em recuperação judicial, nada impede o prosseguimento das ações e execuções judiciais ajuizadas em face de terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, mesmo após a aprovação do plano de recuperação judicial.

Ora, quando a empresa atinge este crítico estado financeiro, todos os seus créditos já se encontram comprometidos e, não raras vezes, seus sócios, através de suas pessoas físicas, encontram-se igualmente comprometidos, pois deram em favor de credores – que na grande maioria são instituições financeiras – algum tipo de garantia pessoal, seja aval, seja fiança ou seja fidejussória.

E por incrível que pareça o empresário, sócio ou terceiro coobrigado da dívida não se beneficia com a aprovação do plano de recuperação judicial, que em muitas vezes possui em seu bojo alongamento da dívida e frequentemente um deságio significativo do crédito, já que é possível ao credor seguir com a cobrança contra esses sem qualquer reflexo do plano, mesmo que este tenha um cunho de novação, de acordo inclusive com o que refere o artigo 59, da Lei 11.101/05.

O mais lógico seria a alteração da lei neste ponto, prevendo que o plano de recuperação aprovado reflita nos garantidores, especialmente no que pertine aos benefícios obtidos no plano de recuperação, tais como prazos mais alongados, deságios e carências, sem que fossem extintas as garantias, uma espécie híbrida de novação. Alternativamente, poderia haver uma previsão legal para que as execuções contra os coobrigados fossem suspensas até que o plano de recuperação judicial fosse adimplido em sua integralidade, e, no caso de descumprimento, retornariam as obrigações contra os avalistas.

Todavia, como é de conhecimento, há por parte de importantes entes econômicos inúmeros interesses envolvidos, de modo que, certamente, a necessária alteração do texto legal está longe de ocorrer.

*Eduardo Schumacher, advogado sócio da Demóstenes Pinto Advogados, é especialista em Direito Societário e Recuperação Judicial.